sexta-feira, setembro 08, 2006

Há condições para evitar normas inconstitucionais - afirma Presidente do Conselho Constitucional, Rui Baltazar, em palestra no ISPU

O PRESIDENTE do Conselho Constitucional, Rui Baltazar dos Santos Alves, disse esta Terça-feira que Moçambique dispõe de condições legais e constitucionais suficientes para evitar que situações de inconstitucionalidade ocorram impunes. O mais importante agora, segundo ele, é accionar os mecanismos disponíveis e assegurar que as instituições de soberania funcionem ao mesmo ritmo.

Intervindo numa palestra subordinada ao tema "O papel do Conselho Constitucional", organizado no âmbito das actividades do Centro de Assistência e Práticas Jurídicas do Instituto Superior Politécnico e Universitário (ISPU), Rui Baltazar forneceu à audiência um historial sobre o surgimento do órgão que dirige no quadro jurídico constitucional moçambicano, destacando o facto de a sua criação ter sido prevista já na Constituição aprovada de 1990, que também introduziu o multipartidarismo e uma nova orientação da economia nacional, até então do tipo centralizada.

Na óptica do presidente do CC a Constituição de 1990 estabeleceu uma divisão nítida entre os sistemas no plano legal e institucional, entre os período pós-independência e pós 1990. No entanto, ele entende que o legislador da altura parece não ter sentido a pisarem terreno firme, nomeadamente ao não se referir com a necessária profundidade nos quatro artigos consagrados ao assunto. "O legislador parece que tinha poucas certezas, mas tinha algumas, como por exemplo que o Conselho Constitucional tinha que dirrimir conflitos de competências ou decidir sobre assuntos como a realização de referendos em Moçambique. Infelizmente, de lá para cá, nunca houve situação que exigisse tal exercício", disse Rui Baltazar.

Outra das certezas que o legislador tinha na altura, era de que o Conselho Constitucional não funcionaria logo a partir da sua criação, uma vez que não havia condições efectivas para o mesmo funcionar. Como consequência disso, embarcou-se numa disposição transitória que determinou que as competências do Conselho Constitucional fossem confiadas ao Tribunal Supremo. "Em 2003 a Assembleia da República aprovou a Lei 4 / 2003 que aprova os Estatutos do Conselho Constitucional, que previa que o órgão tinha que começar a funcionar 120 dias após a entrada em vigor desta lei. Devido à permissividade, nada disso aconteceu até que a Lei 9/2003 viria a revogar a 4 /2003, marcando a entrada efectiva do funcionamento do CC, já perto do final de 2003", recorda.

Entretanto, ainda de acordo com a nossa fonte, este dispositivo não resolveu o problema uma vez que quando se aprova o Estatuto orgânico do CC, já estava em processo a elaboração da Constituição de 2004, cujos debates produziram um impacto adverso no ordenamento jurídico usado como fundamento para a criação do Conselho pela Constituição de 1990.

Manutenção da designação de Conselho Constitucional

Uma das novidades introduzidas pela Constituição de 2004 foi a manutenção da designação de Conselho Constitucional, embora houvesse já uma tendência de se designar o órgão como Tribunal Constitucional. "Esta decisão demarcou claramente o Conselho Constitucional dos Tribunais...", disse Rui Baltazar.

Nas suas atribuições, o Conselho Constitucional aplica o Direito não só em situações concretas como também aprecia a legalidade das normas jurídicas tudo com estrita observância e respeito à lei. Paralelamente, o Constitucional exerce o controlo da legalidade dos órgãos normativos do Estado, naquilo que é considerado a sua principal competência.

Numa dissertação marcadamente pedagógica, Rui Baltazar foi explicando que o controlo da constitucionalidade das normas pode ser feito pelos próprios órgãos que as elaboram, no quadro da interdependência entre os órgãos ou por outros órgãos. "O Conselho Constitucional não tem o poder de tomar a iniciativa de declarar a inconstitucionalidade de determinada lei, seja quais forem as evidências que porventura tenha. Tem que esperar que o problema da inconstitucionalidade seja suscitado por outro órgão.

Nos termos da Constituição de 2004, as questões de inconstitucionalidade podem ser suscitadas pelo presidente da República, pelo PGR, pelo primeiro-ministro, pelo presidente da AR , por um terço dos deputados da AR...", disse Rui Baltazar.

Ainda segundo ele, a constituição de 2004 introduziu um importante desafio ao exercício da democracia em Moçambique, estabelecendo que com duas mil assinaturas os cidadãos podem, igualmente, suscitar a inconstitucionalidade de uma lei. Na opinião do presidente do CC, Moçambique pode estar a ressentir-se do facto de ter vivido muitos anos numa situação de monopartidarismo. "Moçambique não tem conhecido uma situação de alternância política.

Neste contexto é normal que não surjam contradições que suscitem uma intervenção do Conselho Constitucional...", disse. Aliás, ainda de acordo com Rui Baltazar, a fraca de solicitação da intervenção do Conselho Constitucional na apreciação de questões de inconstitucionalidade das normas pelos órgãos competentes, pode estar na origem da fraca visibilidade que aquele órgão tem no seio da maioria do público, para quem fica a percepção de que a sua actuação se limita aos momentos eleitores. "A visão que se deve esperar do CC é de um órgão que estabeleça equilíbrio entre os órgãos de soberania e que contribua para a estabilidade do país...", acrescentou.

Na fase de debate que se seguiu à dissertação, um dos participantes questionou a razão por que, funcionando desde 2003, o Conselho Constitucional não tenha exercido a fiscalização preventiva para evitar que se tenham cometido os erros alegadamente plasmados na constituição de 2004. Na resposta, Rui Baltazar reconheceu haver problemas na constituição de 2004 mas ressalvou que o CC, por si, não pode desencadear situações de inconstitucionalidade das leis, cabendo, antes, à Assembleia da República que pode aprovar e revogar as decisões ou disposições constitucionais.
Fonte: Notícias (2006-09-08)

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